De Hipátia a você: Mulheres na ciência

Ser mulher é…

Ser caça
Dia e noite
E embora tenha muito a pensar
– espera! Animal pensa?
Deve se preocupar em ser caça atraente

É ser despinhada logo quando broto
Pra ser flor delicada
É ser astro
E mesmo que sua luz carregue importantes informações
É apagada da história do universo
Pra mostrar que astro não brilha
Hipátia de Alexandria, Wang Zhenyi, Marie Curie, Mileva Einstein, Lise Meitner, Emmy Noether, Cecilia Payne, Maria Mayer, Chien-Shiung Wu, Katherine Johnson, Rosalyn Yalow, Vera Rubin, Annie Easley, Jocelyn Burnell, Sau Lan Wu, Maryam Mirzakhani. Estes são apenas alguns exemplos de mulheres que fazem parte da história de descobrimento da natureza e do universo. Mas o mural de cientistas foi erguido, e aparentemente nele estão, em sua maioria, rostos masculinos. Esquecidas. Por trás de suas descobertas suas vozes ecoam,esforçando-se para serem ouvidas pelas jovens meninas. Mas sem efeito. Quem fez o mural? O patriarcado.

Às mulheres sempre foi negligenciada a educação. Entretanto, mesmo alcançado este direito básico, as aulas de exatas ainda ficaram reservadas para os meninos. Isto se reflete no problema atual: a falta de participação efetiva das mulheres na ciência.

Hipátia ( Egito séc IV), filósofa, astrônoma e a primeira mulher matemática registrada na história, lecionava na Academia de Alexandria. Além de inventar uma versão do hidrômetro, e estudar o sistema solar, também esteve envolvida na criação do astrolábio. Ela, no entanto, não era considerada “mulher”, mas sim um ser de inteligência superior. Foi chamada de bruxa e morta em praça pública por cristãos furiosos.

Mileva Maric (1875-1948), era física e matemática austro-húngara. Influenciada pelo pai, estudou no Instituto Politécnico de Zurique, onde era a única mulher em sua sala de aula. Entre os alunos estava Albert Einstein. Eles estudavam juntos e se casaram, embora o relacionamento não fosse aprovado pela família de Einstein, que considerava Mileva “intelectual demais”. Em 1905 foi publicada a primeira versão da Teoria da Relatividade, na qual o nome de Mileva estava registrado como “coautora”. A partir daí, evidências mostram que seu nome desapareceu dos futuros trabalhos, mesmo tendo cooperado. No final, o Nobel foi para Einstein e para o orientador de Mileva pelo trabalho sobre efeito fotoelétrico, que ironicamente ela que havia trazido para Einstein.

Chien Shiung Wu (1912-1997) era física chinesa. Seu interesse pela física surgiu quando teve contato com a biografia de Marie Curie. Em 1957 os físicos Lee e Yang receberam o prêmio Nobel pela descoberta da violação da paridade em núcleos atômicos, que só pode ser comprovado através dos experimentos de Mrs. Wu, que não foi premiada. Por trás dessas histórias pouco conhecidas, é revelado o histórico de silenciamento da mulher na ciência.

Para as mulheres negras, a situação é ainda pior. No Brasil de 1880, enquanto as mulheres brancas ingressavam nas universidades, as negras eram escravizadas. E nunca houve uma inserção dos negros na sociedade de classes. Os resultados disso mostram que em torno de 5% das mulheres na graduação de ciências exatas são negras, e em estágios mais altos da carreira, elas correspondem a menos de 3% dos bolsistas de pesquisa científica (CNPQ).

Em entrevista, a física experimental e matemática Patrícia Rebello Teles (professora visitante da UERJ), nos conta sobre sua trajetória no campo das exatas. Foi ex-aluna do Colégio Pedro II (CPII) e única mulher em sua turma a querer entrar na área de exatas. Embora gostasse de física, Patrícia nos conta que não recebia o apoio de seus professores. “Fiz matemática (…) Eu tinha uma professora de matemática. A representatividade influencia muito, mas eu sempre quis fazer física”. Sempre buscando durante sua vida acadêmica a física, foi somente em 2003 que Patrícia pode iniciar o mestrado na matéria (se manteve afastada por conta de seus filhos e casamento). Quando perguntada sobre o ambiente acadêmico, Patrícia relata que mulheres são vítimas de assédio e que o ambiente da física não é favorável a elas, principalmente para mulheres com o estereótipo feminino. “Se você se pinta, ou pinta as unhas, você é vista como incompetente” e acrescenta que uma mulher estar vestida com roupas do estereótipo masculino, era uma forma de ser um pouco mais respeitada no departamento, assim como no caso da Hipátia- que era entendida como um ser “acima da feminilidade”. Patrícia diz que ainda existem muitos obstáculos e enfatiza que a mulher sempre foi direcionada ao que diz respeito aos cuidados de crianças, linguagens e artes. “A mulher pode ocupar qualquer área, o que não pode é ter um direcionamento de habilidades”. “Quando eu resolvi que faria Física, eu tive que escolher entre ficar casada ou fazer física, (…) Eu larguei tudo, nada disso era meu, mas do meu marido”, finaliza dizendo que a mulher tem que se impor e construir sua própria história.

Além do assédio, as mulheres enfrentam no meio científico dificuldades como a maternidade. Mileva Maric, por exemplo, se distanciou de suas pesquisas para cuidar do filho. Aliás, é relatado que durante os primeiros anos após a gravidez, que demandam cuidados intensos com os filhos, mulheres sentem dificuldade em conseguir financiamento para suas pesquisas por alegação de “baixa produtividade”, afetando a continuidade de sua carreira científica. O mesmo não acontece com cientistas do sexo masculino.

Não conseguiríamos citar todas as mulheres que lutaram para serem incluídas, estudar e trabalhar como cientistas de várias áreas. Todas são importantes, seja seu trabalho mundialmente reconhecido ou não, e devem ser sempre preservadas na história por seus trabalhos que muitas das vezes estão no dia a dia, como painéis solares e cabos de fibra óptica que foram originados por uma pesquisa de Shirley Jackson, a primeira mulher negra a conquistar PhD no Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT).

O patriarcado ainda é dominante na sociedade e não é diferente nas ciências exatas, mas podemos reverter isso! O papel dos educadores em conjunto com a família está no estímulo ao estudo desde cedo.

Aí vêm algumas dicas da nossa entrevistada Patrícia Teles para você, menina que quer ser cientista:

1- Estudar né?; não tem jeito!
2- Tenha foco!
3- Seja altiva! (ter dignidade e amor próprio)
4- Reconhecer sua própria força! Pessoas para dizer que você não pode é o que mais
tem!
5- Não abra mão do seu jeito de ser mulher para poder fazer ciência!
6- E estar pronta pra briga.

Nunca me incentivaram a ser nada
Mal era alfabetizada
Ninguém acredita no meu potencial e dizem que aqui não é o meu lugar…
Mulher não faz ciência
Mulher apenas cuida do seu lar

Antes mesmo de alguém acreditar,
eu fiz e mostrei porque merecia estar lá,
ali eu já não era só presa, caça…
eu me tornava uma ameaça,
eles tem medo
medo do meu poder,
medo do que eu, mulher
posso fazer.

Chego em lugares que Mileva sonhou,
Marie lutou e tantas outras
que o nome você sequer já escutou,
elas fizeram por mim e hoje eu faço por elas.

Não deixando nenhum homem falar no meu lugar,
me definir ou decidir sobre mim
a revolução começou dentro de mim,
isso não é sobre o começo e sim sobre não ter fim.

Agradecimento: Ao Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF) e às inspiradoras aulas dos professores J. A. Helayël-Neto e L. Ospedal que trouxeram este assunto para as discussões do grupo de pesquisa “The Light Wizards of Diractsan”, o qual fazemos parte.

Por Princesas elfas ( Júlia Ceddia, Luana Charbel, Anna Cavalcante (alunas do Colégio Pedro II-Realengo).